LGPD – DA GOVERNANÇA E BOAS PRÁTICAS


Como sabido, a Lei Geral de Proteção de Dados trouxe grandes mudanças na esfera da proteção da privacidade de dados no país, regulamentando esta questão que carecia de uma legislação mais robusta e prática, estabelecendo assim direitos e responsabilidades aos envolvidos.

O que vem exigindo das organizações uma forte reestruturação interna, visando atender os ditames da LGPD, como a reavaliação de processos internos e o mapeamento de atividades relacionadas ao tratamento de dados pessoais.

A governança de dados envolve a implementação de regras, práticas, processos, procedimentos, controles, auditorias, todos com adequações constantes, tendo como propósito o crescimento de uma organização de forma organizada, sustentável, em consonância assim com o ordenamento jurídico vigente e sociedade como um todo.

Uma governança corporativa corresponde a um sistema em que empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, o que abrange o engajamento entre sócios, conselho de administração, diretorias, órgãos de fiscalização/controle e outros relacionados.

Uma das características da governança de dados no contexto da LGPD, corresponde a ideia de implementar o “Privacy by Design”, metodologia criada em 1990, incorporada na legislação europeia de proteção de dados (GDPR) e na própria LGPD.

O objetivo desta metodologia, é que na concepção de um produto ou serviço, seja colocada a proteção da privacidade no centro de todo o desenvolvimento, incluindo tal ideia entre seus valores e conduta ética. Para maior compreensão, deve-se entender os seus princípios:

- Proativo e não reativo: Estabelece uma cultura de atenção e cuidado antecipado na privacidade dos dados. O foco aqui é o gerenciamento de riscos, onde possíveis situações prejudiciais devem ser tratadas de forma adequada e prévia;

- Funcionalidade: A privacidade no uso de dados deve ser realizada de uma maneira que não prejudique o produto ou o serviço e ser desenvolvido, havendo um equilíbrio entre as partes da relação. Note que nada adiantaria restringir o uso absoluto de dados pessoais, isso engessaria o sistema e poderia prejudicar a prestação ao consumidor interessado. Este conceito muito se relaciona a questão de necessidade x adequação, ora trazidos pela LGPD;

- Visibilidade e transparência: O titular deve ter acesso aos seus dados e a transparência no tratamento destes dados é primordial. Lembre-se que a organização não é dona dos dados pessoais de alguém, mas sim, tem a posse temporária e limitada deles;

 - Privacidade no Design: Este princípio diz que a proteção aos interesses e à privacidade do usuário deve ser incluída na concepção de produtos e serviços, como um arquiteto, que ao fazer a planta de uma casa, deve prever encanamentos para o fornecimento de água, circunstância essencial;

- Segurança de ponta a ponta: A segurança dos dados deve ser incorporada em um ciclo constante de avaliações;

- Respeito: Deve-se respeitar os direitos dos titulares dos dados de forma latente, pensando sempre em soluções completas de proteção;

- Privacy by Default ou Privacidade por padrão: Determina que a privacidade seja parte integrante em todos os processos, desde a fase de concepção do produto/serviço, até sua execução. Um exemplo, é que celulares smartphones ao serem arquitetados deveriam vir configurados, de forma padronizada, quanto ao não compartilhamento da localização do aparelho, ficando a critério do titular a permissão futura, visando assim maior segurança ao dono.

E para que esta metodologia seja aplicada é fundamental que todas as pessoas da organização estejam alinhadas e em sintonia com o propósito da LGPD. Sendo figuras essenciais neste contexto o controlador e o operador (tidos como agentes de tratamento), bem como o encarregado:

 - Controlador: pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, a quem competem as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais;

- Operador: pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, que realiza o tratamento de dados pessoais em nome do controlador;

- Encarregado: pessoa indicada pelo controlador e operador para atuar como canal de comunicação entre o controlador, os titulares dos dados e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD);

O encarregado deve orientar os funcionários e os contratados da entidade a respeito das práticas a serem tomadas em relação à proteção de dados pessoais e executar as demais atribuições determinadas pelo controlador em consonância com a lei.

Veja que o encarregado não é agente de tratamento, não pode ser responsabilizado no caso do descumprimento da LGPD, mas a ele cumpre um papel fundamental para os agentes de tratamento, que consiste na avaliação constante de conformidade para a respectiva organização que ele atende.

O encarregado é incumbido de controlar a conformidade da LGPD e demais normas relacionadas, incluindo o compartilhamento de responsabilidades, a sensibilização e a formação de profissionais capacitados em relação às operações de tratamento de dados, mantendo a organização atualizada e apta a tomar decisões.

Um dos procedimentos imprescindíveis para a governança de dados, envolve também a elaboração de políticas e procedimentos, visando a segurança da informação, nas quais sempre devem estar sendo revistas e aprimoradas.

A seguir citaremos apenas o conceito básico de três estruturas pertencentes a segurança da informação:

- Confidencialidade: O acesso à informação é feito somente por pessoas autorizadas;

- Integridade: O conteúdo deve ser protegido de forma que não possa ser alterado ou corrompido;

- Disponibilidade: A informação deve ser devidamente protegida, desde que esteja disponível quando necessária sua utilização ou consulta.

Observe que é completamente possível que exista a segurança da informação sem foco na privacidade, todavia é impossível que exista a proteção à privacidade sem a segurança da informação.

Deve ser feito o gerenciamento de riscos para que a instituições possam monitorar e tratar devidamente os riscos pertinentes a privacidade de dados, a implementação desde gerenciamento amplia a capacidade de se identificar problemas num ambiente, bem como tratá-lo com rapidez e eficiência.

Tal gerenciamento vem por exemplo desde o treinamento e instruções a funcionários, para que ao saírem de sua baia de trabalho não deixem o computador desbloqueado, com o risco de acesso indevido de terceiros, até questões técnicas do ambiente de TI.

Lembrando que deve existir uma finalidade legítima para o tratamento de dados pessoais, a organização precisa do consentimento do titular dos dados, bem como deve haver a transparência na gestão de tais dados.

Em síntese, os agentes de tratamento devem adotar medidas de segurança, técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, alteração, comunicação ou qualquer forma de tratamento inadequado ou ilícito.

A LGPD orienta que haja a implementação também de Boas Práticas e Governança de Dados pelas instituições, nos quais, os agentes poderão formular regras que estabeleçam as condições de organização, o regime de funcionamento, os procedimentos, incluindo reclamações e petições de titulares, as normas de segurança, os padrões técnicos, as obrigações específicas para os diversos envolvidos no tratamento, as ações educativas, os mecanismos internos de supervisão e de mitigação de riscos e outros aspectos relacionados ao tratamento de dados pessoais.

O programa de governança deve demonstrar minimamente o comprometimento do controlador em adotar processos e políticas internas que assegurem o cumprimento da LGPD, de acordo com a realidade e objeto da empresa.

As regras de boas práticas e de governança em privacidade devem ser publicadas e atualizadas com periodicidade, podendo inclusive ser reconhecidas e divulgadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD.

A título meramente exemplificativo, será listado a seguir um rol de ações que uma organização engajada no cumprimento da LGPD deve de alguma forma atuar internamente:

- Nomeação de um encarregado, bem como a criação de uma estrutura de prestação de contas e governança;

- Atualização do Termo de Uso e Política de Privacidade;

- Atualização do Código de Conduta;

- Atualização da Política de Segurança da Informação (documento que define as regras de acesso, controle e compartilhamento de informações de uma organização);

- Mapeamento do fluxo de dados para definição de controles de consentimento, tendo como base a classificação de informações (de forma complementar vide ISO 27.002:2013 e 27.701:2019)[1];

 - Matriz de riscos realizado pela área de TI, criando planos de ação para possíveis problemas técnicos;

- Modelo para gestão e guarda de trilha de auditoria para gestão de logs de consentimento,

- Termos de Confidencialidade que comprometa pessoas físicas e jurídicas a garantir a segurança da informação. Todos que tem acesso ao tratamento de dados pessoais devem estar cientes de sua responsabilidade;

- Atualização de cláusulas contratuais que envolvam todos que de alguma forma forneçam dados pessoais ou participem do tratamento de tais dados (funcionários, consumidores, parceiros, fornecedores, prestadores de serviços etc.).

- Modelo de check-list de Compliance para área de compras e correlatas, determinando procedimentos frente a novos fornecedores e parceiros;

- Comunicar todos os colaboradores e promover treinamentos para que tenham ciência das diretrizes e mudanças trazidas pela LGPD;

- Estabelecer fluxo de auditorias, com o monitoramento contínuo e avaliações periódicas;

- Definir um comitê de implementação da lei, que será treinado para responder por questões que envolvam o tratamento de dados (respaldado pelo controlador);

- Criar canais de comunicação e transparência, assegurando mecanismos de participação do titular de dados;

A organização deve fazer uma análise apurada sobre a sua atual conjuntura, verificando fragilidades e identificando melhorias para que venha a se enquadrar a LGPD, cabendo uma leitura apurada ao artigo 46 e seguintes da LGPD.


Autora desde artigo: Nadya Prinet Godoy

Disponibilizado em: Mar/2021

Photo by Marvin Meyer on Unsplash





[1] ISO. Plataforma de navegação Online. Disponível em: https://www.iso.org/obp/ui/#iso:std:iso-iec:27001:ed-2:v1:en. Acesso em: 21 de mar. de 2021.


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