LGPD - PROCESSOS ADMINSTRATIVOS E FISCALIZATÓRIOS - COMO FUNCIONA?
Agora
em outubro foi publicada a primeira Resolução da Autoridade Nacional de
Proteção de Dados - ANPD, Resolução nº. 1 de 28 outubro de 2021, célebre marco
normativo deste órgão regulador[1].
O
regulamento em tela trata do processo de fiscalização e do processo
administrativo sancionador no âmbito da ANPD, estabelecendo procedimentos a
serem seguidos pelos agentes, titulares e demais entes relacionados ao
tratamento de dados pessoais. Pontuado que de forma subsidiária deverá ser aplica a lei que regula o
processo administrativo no âmbito da administração pública federal (Lei nº.
9.784/1999[2]).
Primeiramente
a fiscalização compreende atividades de monitoramento, orientação e atuação
preventiva no que versa o tratamento de dados pessoais. Sendo destacado o papel
da ANPD na fiscalização de operações de tratamento de dados pessoais tendo como
finalidade: orientar, prevenir e reprimir as infrações ocorrida frente à Lei Geral
de Proteção de Dados - LGPD[3].
Em
seu artigo 4º são tabuladas definições que deverão ser compreendidas pelas
partes envolvidas nos processos administrativos e fiscalizações conduzidas pela
ANPD, vejamos:
Agentes
regulados: agentes de tratamento e demais integrantes ou interessados no
tratamento de dados pessoais;
Autuado:
agente regulado que, uma vez identificados indícios suficientes de conduta
infrativa, tem instaurado processo administrativo sancionador contra si, por
meio de auto de infração;
Denúncia:
comunicação feita à ANPD por qualquer pessoa, natural ou jurídica, de suposta
infração cometida contra a legislação de proteção de dados pessoais do País,
que não seja uma petição de titular;
Obstrução
à atividade de fiscalização: ato, comissivo ou omissivo, direto ou indireto, da
fiscalização ou de seus pressupostos, que impeça, dificulte ou embarace a
atividade de fiscalização exercida pela ANPD, mediante o oferecimento de
entrave à situação dos agentes, a recusa no atendimento, e o não envio ou envio
intempestivo de quaisquer dados e informações pertinentes à obrigação do agente
regulado;
Petição
de titular: comunicação feita à ANPD pelo titular de dados pessoais de uma
solicitação apresentada ao controlador e não solucionada no prazo estabelecido
em regulamentação, nos termos do inciso V do art. 55-J da LGPD;
Requerimento:
conjunto de tipos de comunicação, compreendendo a petição de titular e a
denúncia.
Outras
definições relevantes:
Relatório
de Ciclo de Monitoramento: é um instrumento de avaliação, prestação de contas e
planejamento da atividade de fiscalização da ANPD.
Mapa
de Temas Prioritários: temas prioritários que serão considerados pela ANPD para
fins de estudo e planejamento da atividade de fiscalização no período.
Serão listados a seguir os deveres que os agentes regulados (ora acima definidos) deverão respeitar no caso de formalizada uma fiscalização sobre o tratamento de dados pessoais pela ANPD
- Fornecer cópia de documentos, físicos ou digitais, dados e informações relevantes para a avaliação das atividades de tratamento de dados pessoais, no prazo, local, formato e demais condições estabelecidas pela ANPD;
- Permitir o acesso às instalações, equipamentos, aplicativos, facilidades, sistemas, ferramentas e recursos tecnológicos, documentos, dados e informações de natureza técnica, operacional e outras relevantes para a avaliação das atividades de tratamento de dados pessoais, em seu poder ou em poder de terceiros;
- Possibilitar que a ANPD tenha conhecimento dos sistemas de informação utilizados para tratamento de dados e informações, bem como de sua rastreabilidade, atualização e substituição, disponibilizando os dados e as informações oriundos destes instrumentos;
- Submeter-se a auditorias realizadas ou determinadas pela ANPD;
- Manter os documentos físicos ou digitais, os dados e as informações durante os prazos estabelecidos na legislação e em regulamentação específica, bem como durante todo o prazo de tramitação de processos administrativos nos quais sejam necessários; e
- Disponibilizar, sempre que requisitado, representante apto a oferecer suporte à atuação da ANPD, com conhecimento e autonomia para prestar dados, informações e outros aspectos relativos a seu objeto.
É
reforçado, que cabe ao agente fiscalizado solicitar à ANPD a não veiculação de
informações que contenham dados confidenciais relativos à atividade empresarial
analisada, como dados ou informações técnicas, econômico-financeiras, contáveis
e operacionais cuja divulgação possa representar violação a segredo comercial
ou industrial.
Os
documentos originalmente físicos que forem disponibilizados à ANPD em seu
formato digital, deverão também cumprir requisitos legais como a garantia da
integridade e confiabilidade do documento digitalizado, conforme dispõe o
Decreto nº. 10.278/2020[4].
Nas
fiscalizações o representante indicado pelo agente fiscalizado poderá vir a
acompanhar a auditoria da ANPD, exceto nos casos em que a prévia notificação ou
o acompanhamento presencial sejam incompatíveis com a natureza da apuração ou o
sigilo seja necessário para garantir a eficácia da atividade exercida pelo
órgão regulador.
Sendo
notório que o não cumprimento dos deveres elencados acima pelo agente
fiscalizado poderá caracterizar o que chamamos de obstrução à atividade de
fiscalização (definição trazida no início deste artigo), ficando o infrator sujeito a medidas repressivas e adoção de
ações pertinentes a conclusão da fiscalização pela ANPD.
No
que tange o trâmite processual geral, os prazos serão contados sempre em dias
úteis, iniciados a partir da ciência oficial do agente, excluído o dia do começo
e incluído o dia do vencimento. A ciência oficial do interessado será
considerada nos moldes do artigo 12 desta resolução, tendo como última
instância a intimação do interessado por edital.
Todo
ato administrativo da ANPD será comunicado ao interessado por meio de intimação,
preferencialmente realizados por meio eletrônico, sendo inerente que se
assegure a certeza da ciência deste.
A
ANPD no exercício de suas funções poderá atuar em quatro frentes: 1. Com
atividades de monitoramento (levantamento de informações para subsidiar a
tomada de decisões estratégicas – vide artigo 18 e seguintes – com início
previsto para janeiro/2022); 2. Orientação (visando promover a educação
e conscientização – vide artigo 27 e seguintes); 3. Prevenção (evitar e remediar
situações de risco – vide artigo 30 e seguintes); 4. Repressiva (interrupção
de situações de dano ou risco, recondução à plena conformidade e aplicação de
sanções).
Tais
funções poderão ser exercidas por meio de expedição de ofícios, programas periódicos
de fiscalização, de forma coordenada com órgãos e entidades públicas ou até em
cooperação com autoridades de proteção de dados pessoais de outros países.
Dentre
as premissas que a ANPD deverá observar nos processos de fiscalização ora
previstos no artigo 17 desta Resolução nº. 01, temos a priorização da atuação baseada
em evidências e riscos regulatórios, com foco e orientação para o resultado,
estímulo à promoção da cultura de proteção de dados pessoais e exigência de
mínima intervenção na imposição de condicionantes administrativas ao tratamento
de dados pessoais.
Quanto
ao requerimento do titular para formalizar à ANPD uma denúncia (anônima ou não)
relacionada a ilegalidade do tratamento de dados pessoais, para que seja
apurada pelo órgão regulador, ela deverá ser acompanhada de comprovação de que
o assunto foi submetido ao controlador e não foi solucionado no prazo
estabelecido pela LGPD.
Ponto
em que lembramos que o prazo de resposta do controlador está previsto no artigo
18, §3º da LGPD, com a seguinte redação:
§
4º Em caso de impossibilidade de adoção imediata da providência de que trata o
§ 3º deste artigo, o controlador enviará ao titular resposta em que poderá:
I
- comunicar que não é agente de tratamento dos dados e indicar, sempre que
possível, o agente; ou
II
- indicar as razões de fato ou de direito que impedem a adoção imediata da
providência.
Dentre
as quatro atividades de fiscalização já citadas, na atividade de prevenção, a
ANPD visará reconduzir o agente de tratamento à plena conformidade, ou evitar,
remediar situações que acarretem risco ou danos aos titulares de dados
pessoais, não havendo o que se falar em sanções nesta esfera, podendo adotar as
seguintes medidas:
A
divulgação de informações: A ANPD poderá divulgar informações e dados setoriais
agregados e de desempenho em seu sítio eletrônico como medida preventiva, como
a taxa de resolução de problemas e pedidos de titulares atendidos
Expedição
de avisos: O aviso conterá a descrição da situação e informações suficientes
para que o agente de tratamento tenha como identificar as providências
necessárias.
Solicitação
de regularização e do informe (este último denominado à órgãos públicos): destinam-se
a situações em que a regularização deva ocorrer em prazo determinado e cuja
complexidade não justifique a elaboração de plano de conformidade. O seu não
atendimento poderá ensejar na progressão da atuação da ANPD para, a seu
critério, adotar outras medidas preventivas ou para a atuação repressiva, com a
adoção das medidas compatíveis e será considerado agravante caso seja
instaurado o processo administrativo sancionador.
Plano
de conformidade: Em caso de situações mais complexas a ANPD emitira este plano
contendo o objeto, prazo para regularização, ações previstas para reversão da
situação identificada, critérios de acompanhamento e trajetória dos resultados
esperados. Cabendo ao agente de tratamento comprovar o atendimento ao resultado
esperado, além das medidas adotadas para reversão da situação dentro do prazo
estabelecido. Posto que o não cumprimento do plano de conformidade enseja a
progressão da ANPD para a atuação repressiva, com a adoção das medidas
compatíveis, e será considerado agravante caso seja instaurado procedimento
sancionador.
Atividade
repressiva: Situação em que será instaurado o processo administrativo
sancionador destinado a apuração de infrações à LGPD. Podendo o agente sofrer
sanções administrativas previstas no artigo 52 e seguintes de mesma lei.
O
processo administrativo poderá ser instaurado de ofício pela Coordenação-Geral
de Fiscalização; em decorrência do processo de monitoramento; ou diante de
requerimento em que a Coordenação-Geral de Fiscalização, após efetuar a análise
de admissibilidade, deliberar pela abertura imediata de processo sancionador,
podendo caber recurso contra o despacho de instauração deste processo.
Poderá
ocorrer o procedimento preparatório do processo administrativo, no qual a
Coordenação-Geral de Fiscalização poderá, de ofício ou diante de requerimento,
mediante procedimento preparatório, efetuar averiguações preliminares, quando
os indícios da prática de infração não forem suficientes para a instauração
imediata de processo administrativo sancionador, podendo ocorrer diligências em
tais investigações, bem como tramitarem em sigilo.
Concluída
a fase de instrução do procedimento preparatório, a Coordenação-Geral de
Fiscalização poderá arquivá-lo ou instaurar processo administrativo
sancionador, sem prejuízo da adoção de medidas de orientação e prevenção,
conforme o caso.
Nota-se também, que o agente poderá presentar à Coordenação-Geral de Fiscalização Proposta de Celebração de Termo de Ajustamento de Conduta, que aceito, o processo
administrativo sancionador será arquivado após verificado seu cumprimento
integral. É ressaltado que este termo ainda
será regulamentado pela ANPD.
Instaurado
o processo administrativo, será lavrado o auto de infração que obrigatoriamente
deverá conter a identificação da pessoa natural ou jurídica infratora, a
enunciação da suposta conduta ilícita imputada ao autuado, indicação dos fatos
apurados e por fim o dispositivo legal ou regulamentador relacionado à suposta
infração. Sob o prazo de 10 dias úteis para defesa.
Na
defesa, o autuado deverá apresentar provas dos fatos que alegar, podendo
requerer a produção de outras provas, como por exemplo provas periciais, que
deverão ser analisados tais pedidos pela Coordenação Geral de Fiscalização, havendo
a possibilidade de ser indeferido o pedido conforme o caso concreto.
Veja
que transcorrido o prazo de defesa do autuado, independentemente da sua
apresentação (revelia), será elaborado relatório de instrução que subsidiará a
decisão de primeira instância e o processo será concluso à Coordenação-Geral de
Fiscalização para decisão. Cabendo recursos, haja vista a aplicação do direito
a ampla defesa e do contraditório.
Este
relatório de instrução encerrará a fase de instrução, salvo se a análise
processual indicar que o processo não se encontra suficientemente instruído,
hipótese em que será emitido despacho determinando as diligências a serem
realizadas.
Finda
a instrução processual, a Coordenação-Geral de Fiscalização proferirá a decisão
de primeira instância, cujo resumo será publicado no Diário Oficial da União. A
decisão será motivada, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, bem
como aplicará a respectiva sanção, quando cabível, seguindo os parâmetros e
critérios definidos no §1º do art. 52 da LGPD e na regulamentação expedida pela
ANPD.
Transitada
em julgado a decisão e transcorrido o prazo para cumprimento da sanção
administrativa pecuniária sem a sua respectiva comprovação, o processo será
remetido para cobrança e execução.
Sendo
possível a reunião para julgamento conjunto dos processos que possam gerar
risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos
separadamente, mesmo sem conexão entre eles, seja na fase de decisão em
primeira instância ou recursal.
Caso
seja de interesse do autuado recorrer a decisão, ele terá o prazo de 10 dias
úteis para protocolar seu recurso junto à autoridade que proferiu a decisão, na
qual remeterá o recurso ao Conselho Diretor da ANPD. Salienta-se que em regra
este recurso terá efeito suspensivo e seu julgamento de certo que não poderá
agravar ainda mais sanção originariamente aplicada infrator.
Para
a deliberação do Conselho Diretor, o Diretor Relator se manifestará sobre a
admissibilidade e sobre o provimento total ou parcial, ou indeferimento do
recurso, fundamentando seu voto e, em seguida, os demais Diretores votarão
conforme os fundamentos legais e regulamentares.
No caso da apreciação do recurso puder decorrer gravame à situação do
recorrente, este deverá ser intimado para formular suas alegações no prazo
máximo de 10 dias úteis, antes da decisão.
Caso
o autuado seja condenado ao pagamento de sanções pecuniárias e não venha a
honrá-las até seu vencimento, o devedor será intimado sobre a existência do
débito, fornecendo-lhe todas as informações pertinentes à dívida e sobre a sua
inscrição no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público
Federal (Cadin), no prazo de setenta e cinco dias contados dessa intimação, bem
como o débito será encaminhado para inscrição na Dívida Ativa da União.
Por
fim, os processos administrativos que resultarem em sanções poderão ser
revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos
ou circunstâncias relevantes suscetíveis a justificar a inadequação da sanção
aplicada, seguindo a revisão o mesmo rito do recurso administrativo.
Autora desde artigo: Nadya Prinet Godoy
Disponibilizado em: Nov/2021
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[1]
ANPD - Autoridade Nacional de Proteção de dados.
Regulamento do Processo de Fiscalização e
do Processo Administrativo Sancionador. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-cd/anpd-n-1-de-28-de-outubro-de-2021-355817513. Acesso em: 10 de novembro de 2021.
[2]
Presidência da República. Regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm. Acesso em: 10 de novembro de 2021.
[3]
Presidência da República. Altera a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/l13853.htm. Acesso em: 10 de novembro de
2021.
[4]
Presidência da República. Documentos digitalizados. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10278.htm. Acesso em: 10 de novembro de
2021.
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